Eleita deputada 13 anos após o assassinato brutal de seu filho, Keiko Ota luta agora para fazer com que a pena máxima para crimes hediondos passe de 30 para 100 anos de prisão
Por muito pouco, 82 caixas que guardam, desde 1999, um abaixo-assinado com três milhões de assinaturas a favor de uma pena rígida para quem cometer crimes hediondos não foram parar no lixo. O material encontra-se empoeirado numa sala do arquivo da Câmara dos Deputados, mas foi dado como “desaparecido” até o início da atual legislatura quando a deputada Keiko Ota (PSB-SP), estreante no Congresso, formalizou um pedido de desarquivamento. “Foi preciso ameaçar mostrar o DVD com as imagens da entrega da papelada para eles encontrarem”, disse Keiko. A parlamentar e seu marido, Masataka Ota, encaminharam as assinaturas há 11 anos na esteira da comoção popular pelo sequestro seguido de assassinato de seu filho Ives Ota, então com 8 anos de idade. Mas o projeto, que previa prisão perpétua para esse tipo de criminoso, considerado inconstitucional, nem sequer começou a tramitar na Casa. Nenhum político abraçou a causa ou tentou enquadrar a proposta de iniciativa popular à legislação. Agora, na condição de 11ª deputada mais votada em São Paulo com mais de 213 mil votos, Keiko quer tirar a poeira das caixas e usar a força dos três milhões de assinaturas para apresentar um projeto aumentando a pena máxima de 30 para 100 anos no Brasil. “As pessoas nas ruas estavam nos cobrando sobre o abaixo-assinado. Vamos mudar o texto inicial, adaptando-o à lei, mas sem perder o espírito da ampliação da punição”, disse ela à ISTOÉ.
Os assassinos do menino Ives Ota foram condenados a 43 anos de reclusão, mas cumpriram apenas seis e foram soltos, com base no regime de progressão penal. Com a aprovação da pena de 100 anos, a deputada acredita que será possível manter um preso na cadeia por até 40 anos. “Já seria um grande avanço”, diz. Para que a ideia prospere, a deputada pretende pedir apoio de parlamentares de peso no Congresso, como o líder do PSDB no Senado, Álvaro Dias (PR). O tucano defende o aumento do tempo máximo de prisão para 60 anos, alterando o artigo 75 do Código Penal. Outras proposições nessa linha tramitam na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas não serão aprovadas com facilidade, pois dividem opiniões no meio jurídico. O diretor da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, Marco Antonio Bandeira Scapini, classifica a proposta de demagógica. “Eles estão tentando criar uma prisão perpétua, o que a Constituição veta. Precisamos nos preocupar em resolver o problema dos presídios, em criar políticas públicas de inclusão social.” Já o presidente da Associação Brasil Sem Grades, Luiz Fernando Oderich, está mais afinado com os anseios de parcela significativa da sociedade brasileira. Ele afirma que o aumento do tempo de cárcere inibirá as ações de presos de alta periculosidade. “Existem casos de pessoas irrecuperáveis. Se estiverem soltas, vão cometer um novo crime.”
Desde a morte do filho Ives, Keiko teve uma vida marcada pela superação. No espiritismo, buscou o conforto necessário para seguir a vida adiante. “Como alguém que perdeu o filho, a primeira coisa que vem à cabeça é fazer vingança. Mas percebi que isso só traria mais sofrimento a nossos familiares”, disse Keiko. No ano seguinte ao do falecimento do menino, nasceu Ises, a filha mais nova do casal, e eles criaram o Movimento pela Paz, que ganhou adeptos em todo o País. O movimento, responsável pelo recolhimento dos três milhões de assinaturas, foi o embrião da candidatura de Keiko, dez anos depois. Embalada pelo bordão “chega de violência”, a campanha contagiou os defensores da ampliação da pena para criminosos. Resultado: Keiko conseguiu ser eleita com apenas 12 segundos no horário eleitoral gratuito e investimento de R$ 70 mil. De acordo com o TRE-SP, a deputada do PSB fez a campanha mais barata do Estado ao custo de R$ 0,44 por voto. “Vencemos com a força do trabalho voluntário das pessoas. A parte gráfica foi doação. Gastamos basicamente com combustível”, disse o marido de Keiko, que fez uma dura crítica ao seu partido. “Não tivemos nenhum apoio do PSB.”
KEIKO OTA
ISTOÉ – Qual será sua principal bandeira na Câmara?
Keiko Ota – Vou lutar para aumentar de 30 para 100 anos a pena máxima para quem cometer crimes hediondos, aproveitando o abaixo-assinado com três milhões de assinaturas que reunimos em 1999.
ISTOÉ – Especialistas argumentam que não é o tamanho da pena que inibe o crime e sim a certeza e a celeridade na punição.
Keiko Ota – Achamos que, com penas mais severas, os criminosos vão pensar mais antes de cometer atrocidades. Os assassinos do meu filho foram condenados a 43 anos de prisão. Mas só passaram seis anos na cadeia.
ISTOÉ – Como a sra. conseguiu superar a morte de seu filho, de 8 anos, assassinado em 1997?
Keiko Ota – Com a religião. O perdão salvou nossa vida. Por isso, queremos criar o Dia do Perdão. Não precisa ser um feriado, mas um dia de reflexão.
ISTOÉ – De que maneira a sra. conseguiu se eleger, mesmo tendo apenas 12 segundos na tevê e investindo somente R$ 70 mil na campanha?
Keiko Ota – Com a grande mobilização de voluntários, já que o partido não nos deu apoio nenhum.
Materia retirada da revista N° Edição: 2155 | 25.Fev.11 – 21:00 |